quinta-feira, julho 04, 2013

Eritromelalgia ou doença de Mitchell

Eritromelalgia ou doença de Mitchell
( do grego: erythros – vermelho; melos – membro; algos – dor )

Eritromelalgia  é  uma  situação  patológica,  caracterizada  pela  existência  de  sinais como calor, rubor, tumor, dor e diminuição da capacidade funcional  das extremidades, mais frequentemente das extremidades inferiores ( pés e, menos frequentemente as mãos; as orelhas podem ser atingidas mas este é um fenómeno extremamente raro ). É uma neurose vasomotora. Manifesta-se por vasodilatação das arteríolas e vênulas, com maior afluxo sanguíneo à região, incidindo em qualquer idade, sem predomínio nítido de sexo. Piora com o calor e melhora com a imersão em água fria ou com o clima frio. A eritromelalgia existe em 2 formas, sendo uma a forma primária ou idiopática ou primitiva e a outra secundária.
A forma secundária da eritromelalgia associa-se a outras situações patológicas, nomeadamente dislipidemias, hipertensão arterial, policitemia vera, linfoma, doença de Vasquez, trombocitemia essencial, diabetes tipo II, insuficiência venosa, esclerose múltipla, lupus, artrite reumatóide, esclerodermia, doença de Raynaud, HIV, gota, bem como se associa também a situações não patológicas como a ingestão de café ou álcool. É uma patologia benigna, permanente e melhora com a correcção da patologia associada. Por motivos ainda não totalmente esclarecidos, verifica-se que doses de 650 mg/dia de ácido acetilsalicílico oferece benefício na resolução da sintomatologia. Insónia e stress são tidas como situações desencadeantes da eritromelalgia. Intoxicação por mercúrio também se associa ao desencadear da patologia.
A eritromelalgia é um fenómeno vascular raro, associado a alterações plaquetárias, associado ou não a outras patologias, com acometimentos localizados. Caracteriza-se por vasodilatação das arteríolas e vênulas, paroxística, principalmente das extremidades, com dor ardente, aumento da temperatura cutânea e ardência. A vasodilatação pode ser secundária à acção de fármacos que relaxam a musculatura lisa das paredes vasculares.
Os sintomas podem manter-se ligeiros, durante anos, ou podem ser causadores de uma total incapacidade. O diagnóstico é feito baseando-se na relação da sintomatologia com o aumento da temperatura cutânea. O tipo secundário pode diferir da eritromelalgia primária por a correcção da situação de base fazer passar a sintomatologia da eritromelalgia. No diagnóstico diferencial, devemos incluir as distrofias post-traumáticas, síndrome ombro-mão, doença de Fabry e celulite bacteriana. Como a eritromelalgia pode preceder alterações sanguíneas mieloproliferativas, mesmo por anos, deve ser indicado um estudo da patologia sanguínea para despiste destas como patologia de base relativamente à eritromelalgia e, eventualmente, ser feito o tratamento da patologia sanguínea se existir.
Dado a eritromelalgia ser provocada por vasodilatação dos pequenos vasos, arteríolas e vênulas nomeadamente, usa-se com algum sucesso agentes vasoconstrictores ( 25 mg efedrina per os; propanolol per os 10-40 mg; metirsegida per os 1 mg/4 horas ).

Eritromelalgia é uma alteração rara, caracterizada pela tríada sintomática de hipertermia paroxística das extremidades, com eritema, dor em queimor intensa e aumento da temperatura cutânea, manifestando-se principalmente nos pés e mãos. A exposição ao calor, exercício físico, a acção da gravidade e uso de meias e luvas são factores desencadeantes, enquanto que é factor de alívio da sintomatologia o frio. Esta patologia tem carácter intermitente.

A forma primária da eritromelalgia pode ser familiar, com uma herança autossómica dominante,  ou  esporádica.  Quanto  ao  início  da  patologia,  a  eritromelalgia  pode  ser juvenil   (   início   antes   dos   20   anos,  geralmente  antes  dos  10  anos   )  ou  adulto ( depois dos 20 anos ).
Eritromelalgia juvenil familiar associa-se à subunidade α do gene SCN9A, que codifica um canal de sódio voltagem dependente, e tem predomínio no sexo masculino.
A eritromelalgia secundária tem início geralmente a partir da 3ª década da vida, sem predomínio de nenhum dos sexos. A incidência é de 0.25-0.33/100000 habitantes/ano.

Na etiopatogenia admite-se a existência de anormalidades vasculares primárias ou secundárias, resultantes em edema endotelial, com aumento da temperatura e fluxo sanguíneo, hipóxia, agregação e activação plaquetária com libertação de prostaglandinas que produzem eritema e dor. Neuropatia de pequenas fibras foi também observada.

Admite-se que a eritromelalgia não seja uma entidade patológica autónoma, mas sim um padrão da resposta da microvasculatura cutânea. A eritromelalgia é associada a uma neuropatia de pequenas fibras e vasculopatia primárias, caracterizada por aumento intermitente de fluxo sanguíneo, hipóxia e, possivelmente, shunts, com aumento do metabolismo celular local. Devido aos shunts, substâncias que alteram a distribuição do fluxo sanguíneo cutâneo podem melhorar a oxigenação cutânea e induzir alívio dos sintomas.

A eritromelalgia secundária pode ser provocada como consequência de traumatismos, cujos sintomas persistem após a cura da lesão traumática, mutação a nível dos canais de cálcio ( esta na eritromelalgia primária ), toma de medicação de bloqueadores dos canais de cálcio, policitemia vera, tromboangeíte obliterante, síndrome de Raynaud ( não é propriamente uma causa mas uma situação muitas vezes coexistente ), hiperdébito venoso por fístulas arteriovenosas, linfedema.

A sintomatologia da eritromelalgia pode ser desencadeada por consumo de café ou álcool. Em alguns doentes, consumo de açúcar e mesmo de melão, podem também provocar o início dos ataques.
Eritromelalgia consiste de alterações neuropatológicas e microvasculares. Estas alterações são mal compreendidas na forma secundária, enquanto que na forma idiopática os fenómenos neuropatológicos advêm da hiperexcitabilidade das fibras C nas raízes dos gânglios dorsais. Os nociceptores ( neurónios que respondem pela sensação e condução dos estímulos dolorosos ) são os primeiros neurónios afectados nestas fibras C. Esta hiperexcitabilidade dos nociceptores é a responsável pela dor severa em queimor. Interessante o facto de que enquanto a dor é devida à hiperexcitabilidade, as alterações microvasculares são devidas a uma hipoexcitabilidade. O sistema nervoso simpático controla o tónus vascular cutâneo, e uma resposta alterada deste sistema nervoso a estímulos, como o calor, resulta nos sintomas microvasculares observados.
Estas alterações da excitabilidade, microvascular e neuropatológica, são devidas a mutação nos canais de sódio Naᵥ1.7 ( canal de sódio Naᵥ1.7 é codificado pelo gene SCN9A, hiperexpressado nos neurónios das raízes dos gânglios dorsais e no gânglio trigémeo e nos neurónios dos gânglios simpáticos componentes do sistema nervoso autónomo; Naᵥ1.7 é um canal de sódio voltagem dependente, que joga um papel fundamental na geração e condução dos potenciais de acção, estando presente nos terminais nervosos dos nervos sensitivos à dor, os nociceptores).
É possível que casos de epidemia de eritromelalgia, como se conhece ter acontecido na China, sejam secundárias a infecção por poxvirus, mas esta associação carece ainda de mais consistente confirmação.
A fisiopatologia da eritromelalgia deve ser tida apenas para a forma primária, visto a forma secundária ser muito mal entendida.
Assim, quanto à fisiopatologia da eritromelalgia primária conhece-se que existem 10 mutações da subunidade α dos genes codificadores Naᵥ1.7 desencadeados por potenciais eléctricos ( A βIV-espectrina pode estar envolvida no mecanismo regulador dos canais de sódio Naᵥ 1.5 através da fosforilação da βIV-espectrina por uma quinase-II dependente do cálcio/modulina ). Este gene SCN9A é expressado nas raízes dos gânglios dorsais e nos gânglios dos neurónios do simpático. Todas as mutações apresentaram alterações biofísicas semelhantes. O primeiro efeito destas mutações é os canais Naᵥ1.7 que activam a potenciais mais hiperpolarizados. Canais Naᵥ1.7 actuam como sensores desencadeadores e iniciam potenciais de acção; consequentemente este desvio de perfil de activação resulta em canais que abrem mais próximo do potencial de repouso da membrana. Em muitas mutações, este desvio da activação é acompanhado por desvios na sensibilidade da voltagem de inactivação mais rápida e/ou mais lenta, produzindo alterações mais prolongadas e maiores no potencial da membrana.

Apesar de banho de imersão em água fria fazer aliviar os sintomas, este procedimento é fortemente contraindicado, dado que pode precipitar problemas como lesão da pele e ulcerações cutâneas, frequentemente intratáveis, devido à lesão cutânea.

A eritromelalgia atinge os pés em cerca de 88% dos casos e, tipicamente, é bilateral, embora possa ser unilateral, principalmente nos casos secundários. O alívio da dor por imersão em água fria é tão comum que há quem considere este fenómeno patognomónico.


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